Simpósio na Academia Nacional de Medicina debate mudanças climáticas e desafios para a saúde no Brasil

17/07/2025

Diante de um cenário global marcado por eventos climáticos extremos, desastres naturais e o risco crescente de novas pandemias, a integração entre saúde, meio ambiente e ciência tem se tornado cada vez mais urgente. Foi com esse pano de fundo que a Academia Nacional de Medicina realizou, nesta quinta-feira (17), o simpósio “Mudanças Climáticas e Saúde Única: Desafios Científicos e Estratégias de Resposta”.

Acadêmicos Marcelos Morales e Margareth Dalcolmo ao lado da Presidente Eliete Bouskela durante simpósio sobre mudanças climáticas e seus impactos na saúde

O encontro reuniu especialistas, pesquisadores e autoridades para discutir os impactos das mudanças climáticas na saúde pública e as medidas necessárias para enfrentar esse desafio com base em evidências científicas. A presidente da ANM, Eliete Bouskela, abriu os trabalhos ressaltando a atualidade do tema e elogiando a condução do evento pelos acadêmicos Margareth Dalcolmo e Marcelo Morales.

A preocupação com os rumos das políticas ambientais no país permeou boa parte das falas, especialmente após a aprovação, na véspera, de uma proposta de emenda à Constituição que flexibiliza as regras para o licenciamento ambiental, a chamada PEC do Licenciamento Ambiental. A medida, aprovada pelo Congresso Nacional, reduz exigências legais para empreendimentos com potencial poluidor, como obras de infraestrutura, mineração e agronegócio, o que pode fragilizar ainda mais a proteção de biomas sensíveis e expor populações a riscos sanitários e ecológicos.

Foi dentro desse contexto que Margareth Dalcolmo apresentou o relatório final do grupo de trabalho do Ministério da Saúde que prepara o Brasil para futuras epidemias. Nele é citado a criação de uma instituição com cerca de cem profissionais especializados para atuar em crises, sugerindo a integração da Academia Nacional de Medicina ao conselho diretor. “Novas epidemias não são questão de ‘se’, mas de ‘quando’”, afirmou. Em crítica à PEC, Dalcolmo defendeu o veto presidencial: “Essa decisão põe em risco a saúde de toda a população brasileira.”

Marcelo Morales classificou a decisão do Congresso como “trágica” e ressaltou a importância do diálogo direto entre comunidade científica e Legislativo para influenciar políticas públicas eficazes. “A urgência da pauta exige atuação estratégica da ciência para evitar retrocessos”, afirmou, demonstrando expectativa de que o veto corrija o cenário atual.

Acadêmico Marcelo Morales classifica a decisão da PEC do Licenciamento Ambiental como “trágica” e ressalta a importância do diálogo direto entre comunidade científica e Legislativo para influenciar políticas públicas eficazes

O painel enfatizou também a necessidade de preservar e restaurar os biomas brasileiros, além de alertar para riscos globais, como a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, e a importância da COP30, que deverá firmar compromissos para zerar as emissões até 2040.

Crise ambiental e mudanças no perfil epidemiológico preocupam especialistas

Pesquisadores apresentaram dados preocupantes sobre os efeitos das secas e altas temperaturas na Amazônia, que impactam a biodiversidade e a segurança alimentar das populações locais, especialmente pela contaminação por mercúrio causada pela mineração ilegal. Também foi debatido o impacto dos desastres naturais na saúde mental, com aumento de transtornos como estresse pós-traumático e suicídio, agravados pela falta de apoio psicológico.

Destaque na área de Pneumologia, Margareth Dalcolmo destacou ainda o aumento de viroses e a expansão das doenças tropicais decorrentes das mudanças climáticas, reforçando o conceito de “saúde única”, que reconhece a interdependência entre saúde humana, animal e ambiental. “Pandemias futuras, especialmente de origem zoonótica, são prováveis e agravadas pelo aquecimento global”, disse, ressaltando a importância da vigilância genômica diante da mutação constante dos vírus, como o vírus influenza H5N1, que ainda não tem vacina específica.

Acadêmica Margareth Dalcolmo destaca o aumento de viroses e a expansão das doenças tropicais decorrentes das mudanças climáticas

Ela também lembrou da vulnerabilidade dos idosos brasileiros a doenças agravadas pelo clima e poluição: “A população envelhecida exige atenção redobrada, pois os impactos climáticos elevam os riscos cardiovasculares, respiratórios e neurodegenerativos.”

O simpósio ainda apontou a necessidade de acelerar pesquisas e criar uma rede nacional de laboratórios para garantir acesso justo a vacinas, além de apresentar políticas públicas em andamento, como o projeto Regenera Brasil e iniciativas de bioeconomia sustentável em parceria com comunidades locais.

No âmbito legislativo, foram destacados projetos para proteção de coleções biológicas e fortalecimento da gestão de riscos ambientais, reforçando a importância do engajamento político da ciência.

O professor Adalberto Duval alertou para a baixa verba e a falta de pessoal qualificado para pesquisas na Amazônia, comprometendo a capacidade de enfrentar zoonoses na região. “Sem investimento e formação adequada, a floresta e suas comunidades ficam vulneráveis a doenças que podem se espalhar para todo o país”, afirmou.

Professor Adalberto Duval alertou para a baixa verba e a falta de pessoal qualificado para pesquisas na Amazônia

Por fim, o acadêmico José Gomes Temporão propôs que a Academia Nacional de Medicina envie cartas ao Congresso e ao presidente pedindo veto a leis que prejudicam a saúde pública. “Não podemos retroceder quando o que está em jogo é a vida das pessoas”, destacou. Ele sugeriu ainda a publicação de artigos e comunicação segmentada para ampliar o alcance da mensagem, especialmente junto a gestores e jovens médicos.

Acadêmico José Gomes Temporão propõe que a Academia Nacional de Medicina envie cartas ao Congresso e ao presidente pedindo veto a leis que prejudicam a saúde pública

A sessão foi finalizada com agradecimentos e a expectativa de continuidade nas discussões sobre mudanças climáticas e saúde no país.

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